Quando pensamos em perda auditiva, é comum associar o problema a dificuldades de comunicação, aumento do volume da televisão ou necessidade de pedir que repitam o que foi dito. Mas, nos últimos anos, a ciência tem mostrado que os efeitos da perda auditiva vão muito além do que se ouve — ou do que se deixa de ouvir. Um dos pontos de atenção mais relevantes atualmente é a possível ligação entre perda auditiva não tratada e o risco aumentado de desenvolver demência, incluindo a Doença de Alzheimer.
É importante começar deixando algo claro: Alzheimer é apenas um dos tipos de demência, ainda que seja o mais conhecido e frequente. O termo “demência” abrange um grupo de condições que envolvem o comprometimento progressivo das funções cognitivas, como memória, atenção, linguagem e capacidade de julgamento. Entre essas condições, estão também a demência vascular, a demência frontotemporal, a com corpos de Lewy, entre outras. Em todas elas, o funcionamento cerebral é impactado de forma significativa — e, como mostram os estudos mais recentes, a perda auditiva pode desempenhar um papel importante nesse processo.
Um dos estudos mais amplamente citados nesse contexto é o relatório da Lancet Commission on Dementia, publicado em 2020, que aponta a perda auditiva não tratada como o principal fator de risco modificável para o desenvolvimento de demência. Isso significa que, entre os fatores que podemos agir para reduzir as chances de uma doença como o Alzheimer se manifestar ou progredir, a audição está no topo da lista.
Mas por que a audição influencia tanto o cérebro?
A resposta está no funcionamento integrado do nosso sistema cognitivo. Quando os ouvidos passam a captar menos sons, o cérebro precisa se esforçar para preencher as lacunas: interpretar frases incompletas, decifrar palavras mal ouvidas, acompanhar conversas em ambientes barulhentos. Esse esforço constante exige recursos mentais que poderiam estar sendo utilizados em outras tarefas, como memória ou raciocínio. Com o tempo, essa sobrecarga pode levar à diminuição da eficiência cognitiva — um desgaste lento, mas persistente.
Além disso, muitas pessoas com perda auditiva tendem a se isolar socialmente. Por vergonha de não compreender o que está sendo dito, por medo de repetir perguntas ou simplesmente pela dificuldade em acompanhar conversas, é comum que situações sociais passem a ser evitadas. O isolamento reduz a estimulação cerebral diária, que é essencial para manter o cérebro ativo e saudável. Menos interação, menos desafio, menos exercício mental — tudo isso contribui para o declínio cognitivo.
A ciência também já observou alterações na própria estrutura cerebral associadas à perda auditiva. Exames de neuroimagem revelam que áreas do cérebro responsáveis pela audição e pela memória podem ter seu volume reduzido quando há perda auditiva não tratada. Isso reforça a ideia de que os efeitos vão muito além dos ouvidos: envolvem também o modo como o cérebro processa, entende e reage ao mundo.
Diante desse cenário, a prevenção e o diagnóstico precoce tornam-se estratégias fundamentais. Como a perda auditiva costuma se instalar de forma lenta e progressiva, muitas vezes ela não é percebida imediatamente. São os familiares que notam primeiro: a pessoa aumenta muito o volume da TV, não responde a perguntas, parece distraída ou tem dificuldade em acompanhar conversas em grupo. Em vez de encarar isso como “coisa da idade”, é essencial buscar uma avaliação auditiva com um profissional qualificado.
A importância do aparelho auditivo
O uso de aparelhos auditivos, quando indicado, pode fazer toda a diferença. Mais do que devolver sons, eles devolvem estímulos para o cérebro — e isso ajuda a preservar a função cognitiva. A pessoa volta a se sentir segura para conversar, participar de encontros, ouvir orientações médicas com clareza. Isso impacta positivamente não só a audição, mas também a autoestima, a memória e o bem-estar emocional.
Além dos aparelhos auditivos, o cuidado com a saúde auditiva deve fazer parte de um acompanhamento mais amplo. Fonoaudiólogos, otorrinolaringologistas, geriatras e outros profissionais trabalham em conjunto para oferecer um plano de cuidado completo, que leve em conta as particularidades de cada paciente. E esse cuidado deve começar cedo — antes que a perda auditiva se torne limitante ou comece a impactar a cognição.
Cuidar da audição é, também, cuidar do cérebro. A relação entre perda auditiva e demência está cada vez mais clara nas evidências científicas. O que antes era visto apenas como um problema auditivo agora é reconhecido como uma questão de saúde global — que envolve comunicação, memória, qualidade de vida e independência.
Se você tem notado mudanças na sua capacidade de ouvir ou convive com alguém que apresenta sinais de perda auditiva, não adie esse cuidado. A intervenção precoce é a chave para manter o cérebro ativo e a vida em movimento. Afinal, ouvir bem é também pensar com mais clareza, se relacionar com mais confiança e viver com mais autonomia.
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Referências:
- Livingston, G. et al. (2020). Dementia prevention, intervention, and care: 2020 report of the Lancet Commission. The Lancet, 396(10248), 413-446.
- Lin, F. R., & Albert, M. (2014). Hearing loss and dementia – who is listening? Aging & Mental Health, 18(6), 671-673.
- Deal, J. A. et al. (2017). Hearing impairment and incident dementia and cognitive decline in older adults: The Health ABC Study. The Journals of Gerontology: Series A, 72(5), 703-709.